PARA POLÍTICOS, BOI PARIU.
PARA O POVO, VACA MORREU!
José Fernando Inácio Itamelo, ou simplesmente coronel Inácio, não era o Demo em pessoa, mas apenas o filho dele.
Coronel Inácio era o cão chupando manga!
coronel Inácio na infância dedicou-se a matar passarinhos e extripar sapos e a cegar animais domésticos.
Na adolescência abusar as pobres filhas dos colonos e a beber feito um degenerado.
Este limitado e semi-analfabeto trovador que vos narra vai contar as crueldades desse malvado coronel, não todas, porque ai não seria um cordel, mas uma enciclopédia.
Coronel Inácio era homem de fogo nas ventas. De ódio tão latente que quando a blasfemar na sala seu ódio se materializava e ia quebrar louças na cozinha.
Bebia cachaça com pólvora e como tira-gosto degustava pimenta malagueta, enquanto gritava palavras de baixo-calão.
Quando ia fumar não usava fósforo, nem isqueiro. Acendia o cigarro nos seus olhos vermelhos injetados de ódio.
De tamanha maldade no coração, por exemplo, num só dia cometeu três covardes crimes:
Matou sua própria mulher, que demorou a atender um chamado seu e a jogou aos jacarés de sua criação comercial e os bichos famintos e medonhos a devoraram com tamanha fúria que nem os ossos sobraram.
Disparou um tiro de escopeta em seu único filho que chorava gritando pela mãe e o jogou para ser comido pelos terríveis jacarés, tal qual a mãe.
Logo após estas duas maldades, ó destino desafortunado, bate-se palma na porteira da fazenda
Quando coronel Inácio foi atender, era um pacato lavrador, com a
enxada nas costas, a pedir trabalho por dia ou empreitada.
O malvado coronel Inácio foi logo dizendo que ele devia era pedir esmolas e deixar de encher o saco.
O humilde lavrador ponderou que sendo ele um honrado trabalhador e não possuindo nenhum atributo que o credenciasse a esmolar, não era justo esse ofício exercer,
Pois aleijado não era, erisipela não tinha, doença do coração ausente, incômodo degenerativo não tinha e cegueira não convinha.
Coronel Inácio não respondeu com palavras, mas com ação. Num pulo
medonho voou para cima do desinfeliz do lavrador e com a peixeira vazou os dois olhos do honesto trabalhador e só então falou: Já tem o credenciamento seu porco, cego você já é!
Se alguém dentre meus poucos leitores duvidar dessa narrativa é só ir à matriz de Santana do Agreste e confirmar que o pobre ex-lavrador, hoje cego e inválido para a lida, a esmolar está.
Como pode num coração humano caber tanta maldade?
Até hoje nunca me esqueço e ainda me punje o coração a maldade feita ao negrinho, filho de um colono seu: Acusou-o de roubar um ovo e pegou o desinfeliz e o besuntou de melado e o amarrou no formigueiro onde foi devorado vivo, enquanto o malvado coronel Inácio ria!
Mas tarde esta verdade verdadeira passou para a história como o folclore do negrinho do pastoreio.
Mas coronel Inácio, monstro cruel, não matava só por crueldade, matava também por precisão. Matava os proprietários das fazendas vizinhas para apossar de suas terras e anexá-las à fazenda dele.
Graça a este expediente sua fazenda já não era apenas um latifúndio, mas uma sesmaria.
Matava também por ambição. Matou bem matado e bem esfolado o pai e seu único irmão e a mãe internou num hospício que era pior que uma prisão.
Tanta maldade só para ser o único herdeiro de toda a fortuna da família.
E no tribunal do júri, foi absolvida graça a brilhante defesa da junta de advogados contratada para sua defesa que pediu sua absolvição por ser ele órfão de pai e arrimo da mãe que era doida varrida.
Matava também por dó! Não podia ver ninguém sofrendo de incômodo grave, ou simples dor de dente, como remédio sacava o trabuco e desencarnava o vivente.
Coronel Inácio era pior que serpente e para comprar sua impunidade financiava campanhas políticas em todo seu estado.
Vereadores, prefeitos, deputados estaduais e federais e até governador todos comendo em suas mãos.
Até que num mau dia resolveu o alcance de suas maldades ampliar por achar que o sofrimento do povo estava menor que o merecido planejou aumentar o castigo.
Devido a isso se candidatou e se elegeu deputado federal com a maior votação do país.
E seu anteprojeto-de-lei foi logo colocando em votação.
O projeto era a volta da escravidão, com senzala, açoite, pelourinho capitão-do-mato e leilão de escravos.
Em seu discurso em defesa do anteprojeto foi veemente e até brilhante. Argumentou que tal medida acabaria com o desemprego, pois a neoescravidão não seria por raça ou credo, mas por classe social.
Todo cidadão que não tivesse propriedade de monta seria automaticamente escravizado.
Todos os demais deputados ficaram indignados e pediram o imediato arquivamento do anteprojeto, pois ele era inconstitucional e seu autor merecedor de severa punição.
Os deputados de todos os partidos solicitaram uma sessão secreta para discutir tão macabro anteprojeto e decidir por uma severa punição, pois em público não ficava bem discutir tamanha afronta à nação.
Coronel Inácio até então, ainda, estava orgulhoso de seu feito, pois se conseguia indignar gente tão corrupta e ruim era porque sua maldade sobrepujava o congresso pervertido, feito escória da nação.
Mas coronel Inácio longe das câmeras da TV e dos gravadores das rádios é que tomou pé da verdadeira situação:
O congresso queria puní-lo, não pelo anteprojeto, mas pela burrice de propô-lo.
O presidente da câmara em seu discurso de abertura da sessão abriu o peito, rasgou o verbo, e falou:
Como pode alguém da elite ser tão subversivo a ponto de querer dinamitar os alicerces da ordem constituída.
Como podia alguém no poder propor um anteprojeto tão nefasto ao patrão, pois a volta da escravidão encareceria a produção.
A compra de escravo era caro e imobilizaria o capital.
E sendo o escravo uma propriedade teria que ser bem alimentado e sua saúde mantida para ter o seu valor de revenda mantido ou aumentado.
Como podia um membro da elite, em sã consciência, contestar a ordem vigente que tanto capital permitiu à burguesia acumular.
Que até cego via a vantagem da neoescravidão que transformou o pobre trabalhador em pária da nação.
Que o trabalhador, com as leis vigentes, fora trasformado em laranja que durante sua vida era espremido e depois de feito bagaço era abandonado à própria sorte.
As leis vigentes transformaram o trabalho em mercadoria barata. Fora das fábricas havia milhares de outros trabalhadores, feitos laranjas, aguardando a vez de serem espremidos.
Que a democracia só existia como farsa, que a liberdade era uma trapaça. Porque quem está desempregado e faminto por mais que não pareça está acorrentado.
Que democracia era um engodo porque o salário vigente não dava para alimentar nem mesmo um só escravo e quem dera ao trabalhador e sua família.
O trabalhador atual custava menos que manter um escravo com a vantagem de não haver a imobilização do capital.
Que o sistema vigente, que democracia era chamado, era perfeito para legitimar o regime canalha. Permitir a ascensão de genocidas, ladrões e cafetões, porque neste sistema não era necessário ser, mas parecer.
Inventaram um tal marketing político, uma tal propaganda e uma tal pesquisa de opinião.
Com a pesquisa de opinião os facínoras descobriam o que o povo queria e com o marketing e a propaganda transformavam demônios em anjos, picaretas em estadistas.
Depois da corja eleita começava a roubar e a votar leis para cassar os poucos direitos dos trabalhadores.
E quanto o povo oprimido reclamava, suprema maldade: diziam que culpado era o povo que não sabia votar.
Que com este sistema, que democracia era chamado, todo patrão venceria.
Com a plutocracia vestida com as sagradas vestes da democracia o grito de liberdade jamais ecoaria, pois o peão, enganado, com o seu voto a legitimaria, para sempre, amém!